O programa Mais Médicos é uma iniciativa fadada ao fracasso porque, em pouco tempo, faltará estímulo para os médicos continuarem no programa sejam eles brasileiros ou estrangeiros. Os médicos que aderiram, fizeram por necessidade financeira imediata. Não há perspectiva de carreira. Sentirão a falta de estrutura para o trabalho medicoassistencial, de cultura, de educação para os filhos, de lazer social, sentirão o isolamento familiar e a ausência do companheirismo com os amigos.
Os médicos que estão migrando para interior de cidades carentes e da periferia desassistida são diferentes dos imigrantes de outros países e dos migrantes de um estado brasileiro para outro porque estes vão com esperança de progredir, de criar novas raízes, de ganhar dinheiro, de conquistar um novo status social. Por isso, ralam satisfeitos porque teem um futuro pela frente. E os profissionais do Mais Médicos, o que os espera depois de 3 anos? Nada, nem carteira assinada.
No Plano Nacional de Saúde (PNS) experimentado nas microrregiões de Nova Friburgo-RJ, Barbacena-MG e Mossoró-RN durante dois anos no final da década de 60, do qual participamos ativamente e o documentamos, houve a migração espontânea de 15 médicos para 11 cidades carentes. Assim aconteceu porque o processo operacional do Plano lhes dava motivação. Vejamos os resultados nas três áreas geográficas: Nova Friburgo: dos 9 municípios, 2 não tinham médicos antes do PNS.
Todos passaram a ter com a fixação da moradia de dois médicos em Duas Barras e duas médicas em Trajano de Morais. Barbacena: dos 21 municípios, apenas 4 tinham médicos. Aquela microrregião conseguiu suprir o déficit de 6 municípios (Capela Nova, Barroso, Alto Rio Doce, Bias Fortes, Ibertioga e Carandaí) onde passaram a residir médicos com suas famílias. Os demais municípios carentes eram visitados periodicamente por policlínicos durante a semana. Os profissionais que se deslocaram para dar esta assistência recebiam uma remuneração especial. Mossoró: dos 19 municípios, só 3 tinham médico antes do PNS: 27 em Mossoró, 23 em Areia Branca e 2 em Caraúbas. Depois da implementação do PNS houve a fixação de médicos em 5 municípios (4 em Apodi,1 em Umarizal, 1 em Augusto Severo e 1em Olho d´Água dos Borges). Completou-se o número de médicos na microrregião com a admissão de mais 5 para Mossoró e mais 1 para Caraúbas.
Nem o governo atual, nem os posteriores ao Governo Medici, nem as entidades médicas conheceram estes dados porque a experimentação foi encerrada quase de sopetão, quase sem diálogo, pelo regime discricionário da época do AI-5 e nada se aproveitou de excelentes subsídios deixados, os quais, devidamente atualizados, podem ser bastantes úteis agora para ajudar a debelar a triste crise da Saúde atual. Do exposto pode-se concluir que o programa Mais Médicos é uma solução pontual. A Saúde precisa é de uma solução estrutural organizando-se em distritos microrregionais de saúde utilizando o know how do PNS. As microrregiões poderão ser formadas por um grupo de municípios no interior e um conjunto de bairros nos grandes centros.
Fonte: Os dados sobre o Plano Nacional de Saúde estão relatados da página 74 até 90 no nosso recente livro “Fortalecimento do SUS com a participação popular”.